A TV Globo tomou uma polêmica decisão nesta sexta-feira, 9, ao decidir trocar a apresentadora Sandra Annenberg do Jornal Hoje.
A partir de agora, a atração não será mais comandada por dois nomes, como era até a saída de Dony De Nuccio.
Assim que setembro se iniciar, a apresentação ficará a cargo exclusivamente de Maju Coutinho, que vem ganhando cada vez mais destaque na emissora.
O público ficou chocado com a decisão, uma vez que ainda sente a falta de Evaristo Costa e via em Sandra, uma das melhores e mais simpáticas jornalistas do canal.
Agora ela dividirá o Globo Repórter com Glória Maria.
Apresentador do programa de sexta há anos, Sérgio Chapelin está de saída por vontade própria.
Ele procurou o diretor de jornalismo do canal há cinco anos para anunciar sua saída, mas foi convencido a esperar até agora.
Você pode ler o longo depoimento de Ali Kamel abaixo, contando como tudo aconteceu e foi decidido:
Hoje é dia de homenagens e de lembrar histórias.
Cinco anos atrás, Sérgio Chapelin me procurou. Era a época de renovação do contrato. Sempre gentilíssimo, ele me disse que acreditava que era hora de parar. Sérgio adora o que faz, tem uma relação de décadas com o público, com o jornalismo, mas queria mais tempo para a família, para aproveitar a vida sem tantas obrigações. Eu discordei, e o carinho dele pelo público e pelo jornalismo é de tal ordem, que ele acabou se convencendo a ficar mais cinco anos e a voltar a conversar sobre o assunto no futuro. Esse futuro chegou, ele me procurou algumas semanas atrás e a conversa se repetiu. Mesmo apaixonado pelo que faz, Sérgio ponderou que é parte da sabedoria encontrar o momento de desacelerar e aproveitar mais a vida, o tempo com a família.
Conversar com Sérgio é sempre um prazer. Algo na natureza dele o faz ser o mesmo de quando começou na Globo, quase cinquenta atrás, um pioneiro: a vitalidade, a voz, a energia, o carisma são os mesmos (temperados pelos cabelos grisalhos). Com anos de diferença, eu e ele temos uma origem profissional comum, a Rádio Jornal do Brasil, e essa coincidência me alegra. Quem o trouxe para a Globo foi Dirceu Rabelo, a “voz” da Globo ainda hoje. Dirceu o chamou para um teste em 1972. Ele veio em roupas esportivas, o cabelo longo e se pôs à prova diante de nossa querida Alice-Maria e do editor Silvio Júlio. Foi aprovado, mas teve de voltar no dia seguinte com uma orientação expressa de Alice: “Venha com terno e gravata porque o Armando Nogueira vai ver tudo”.
Armando adorou e Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho), também. Boni o queria logo no Jornal Nacional, mas Armando precisava dele no Jornal Hoje, para substituir Ronaldo Rosas. Sérgio dividiria a apresentação com Sônia Maria e com Márcia Mendes. “E também com dois comentaristas muito jovens, Nelson Motta e Scarlet Moon”, Sérgio me contou, sorrindo, mas logo lamentando a morte precoce de Marcia e Scarlet. Ficou no Hoje apenas um mês, porém. O sucesso foi tão grande que quando o saudoso Hilton Gomes deixou o Jornal Nacional, Sérgio foi o escalado para fazer dupla com Cid Moreira, e essa dupla marcaria para sempre a história da Globo. Sérgio participou também da estreia do Fantástico, em 1973, sem deixar o Jornal Nacional, e foi o primeiro apresentador do Globo Repórter. Eu disse a ele que isso era um feito, mas Sérgio, sem nunca abandonar seu jeito simples, me disse: “É um orgulho, claro, mas naquela época, eu apresentava o Jornal Nacional, o Fantástico e o Globo Repórter, não tinha moleza, mas era tudo um grande prazer”.
Em 1974, o grande Heron Domingues, que apresentava no fim da noite o Jornal Internacional, teve um enfarte fulminante que o matou tão cedo. Foi logo depois de divulgar aos brasileiros uma informação de repercussão mundial: a renúncia do presidente Nixon, o ápice do escândalo Watergate. Foi uma edição marcante. O satélite abriu antes do início discurso do presidente. Não estava no ar nas emissoras, somente em circuito fechado para quem tinha acesso ao sinal da Casa Branca. Nixon começou a brincar em frente à tela, fez caretas e sorriu. Armando Nogueira, com o jornal no ar, disse a Jorge Pontual, redator do telejornal, para usar as imagens e escrever um “boa Noite” com base nelas. Pontual correu para escrever a tempo o texto, que finalizava assim: “Como um ator antes da novela, como um político que fez sua carreira dominando a televisão e às vezes sendo vencido por ela, Richard Milhous Nixon se despediu do cargo mais visado da terra com um sorriso”. Pontual se agachou por debaixo da mesa de Heron e entregou o papel com o texto. E Heron leu a nota, com aquelas imagens exclusivas (Pontual viria a ser por muitos anos diretor do Globo Repórter e, hoje, é correspondente em Nova York). Era o dia nove de agosto de 1974, e, na noite seguinte, lá estava Sérgio substituindo o amigo morto na véspera. Ficou na função por nove meses, quando o Jornal Amanhã foi criado, com apresentação de Carlos Campbell e Marcia Mendes. Voltou para o Jornal Nacional, onde ficou até 1983, ao lado de Cid, apresentando também eventualmente o Fantástico, Globo Repórter e a primeira versão do Jornal da Globo.
Ficou um ano no SBT, mas logo voltou, a pedido de Boni e de Armando. Foi para o Fantástico até 1989, sozinho ou dividindo a apresentação com Valéria Monteiro e Bonner. Mas, em 1985, apresentou, sozinho, uma das edições mais marcantes do Jornal Nacional. E num domingo. Foi o JN especial sobre a morte do presidente-eleito Tancredo Neves, depois de 37 dias de internação e muitas cirurgias. O Fantástico foi interrompido bruscamente, no meio de uma reportagem, para que o repórter Carlos Tramontina, hoje apresentador do SP2, anunciasse que o secretário de imprensa de Tancredo, Antônio Britto, faria o pronunciamento que ficou gravado na memória de todos: “Lamento informar que o excelentíssimo senhor presidente da República, Tancredo Neves, faleceu esta noite, no Instituto do Coração, às dez horas e vinte e três minutos”. Logo depois de uma rodada de repórteres, já no cenário do JN, Sérgio, emocionado, disse para aqueles que ligavam a televisão naquele momento: “O presidente Tancredo Neves está morto, como acaba de anunciar o secretário de imprensa, Antônio Britto”. Mudou de câmera e leu, com o tom certo que fez dele um mestre, o editorial que visava a homenagear Tancredo e consolar o país, tomado por comoção. O início dizia assim: “Nessa hora de profunda tristeza, o Brasil se sente mais só. Todos nós brasileiros estamos sofrendo muito. O presidente nos deixa, entre lágrimas e saudades, a certeza de que haveremos de viver uma Nova República”. E, por horas, ancorou aquela cobertura histórica.
Em 1989, voltaria a se dedicar exclusivamente à apresentação do Jornal Nacional ao lado de Cid até 1996, quando passou a ser o titular do Globo Repórter. São 23 anos comandando o programa, campeão absoluto de audiência, num longo convívio com a genial Silvia Sayão, diretora do programa durante todo esse período (e por muitos mais).
Ano após ano, são inúmeros os episódios marcantes da carreira de Sérgio (caberiam em mais de um livro). Se escolhi esses para citar é porque brotaram na conversa que tivemos (na memória dele e na minha, como espectador e admirador). Olhando para tudo o que Sérgio fez, para o seu pioneirismo (quem mais pode dizer que estava na estreia de dois fenômenos como o Fantástico e Globo Repórter?), para a sua imensa contribuição ao nosso jornalismo, foi impossível não me render aos argumentos dele. Como dizer não ao desejo de se dedicar mais à família e à vida, tendo ele sido esse gigante para a Globo? Confesso que fiquei emocionado, na terça, durante a nossa conversa de arremate. Mas disse a ele que sim. Sérgio deixará o Globo Repórter no fim de setembro. Mas não deixará a Globo. Como Cid Moreira, continuará ligado à emissora que a ele é tão grata. Tenho certeza de que falo por todos nós, seus colegas, quando, em nome da TV Globo, agradeço seu trabalho magistral. Sérgio, muito, muito obrigado. Sua contribuição ao nosso jornalismo é imensurável.
Como substituir alguém como Sérgio Chapelin? Com duas das mais completas e consagradas jornalistas da televisão brasileira, Glória Maria e Sandra Annenberg. Conversei com elas e fiquei imensamente feliz ao perceber o entusiasmo delas diante do novo desafio, tanto Sandra como Glória. O Globo Repórter, eu sei, empolga todos nós jornalistas, porque é um programa vitorioso, de altíssimo nível.
Glória começou na Globo, uma menina, como estagiária, em 1971, quando se começava a estagiar no momento em que se chegava à universidade. Já em novembro daquele ano, foi protagonista de uma das mais importantes coberturas da Globo, a queda do viaduto Paulo de Frontin, que matou 29 pessoas e feriu 18. Numa época em que não havia telefone celular, internet, redes sociais, ela descobriu em sua ronda que o viaduto desabara, fez as primeiras apurações que já davam a dimensão da tragédia e, assim, permitiu que a Globo entrasse cedo naquela cobertura tão importante. Nos dias seguintes, participou dos trabalhos aprendendo com os repórteres mais experientes. Foi seu batismo de fogo. “Você imagina uma foca recebendo uma informação com aquela dimensão? No início do início da carreira!”, Gloria sempre me diz, como que incrédula.
Glória é uma jornalista pioneira: foi a primeira repórter a fazer um vivo no Jornal Nacional. Se, ainda hoje, um repórter experiente fica ansioso ao entrar no ar, dá pra imaginar o que foi a proeza quarenta e dois anos atrás, em 1977. E não foi fácil. Todos muito empolgados com a possibilidade de entrar ao vivo sem equipamentos enormes (mas gigantes em relação aos de hoje), a ideia foi fazer o vivo na Avenida Brasil, durante um enorme engarrafamento. Tudo estava certo quando, cinco minuto antes de ir ao ar, os refletores desligaram. A saída foi criativa: Glória se ajoelhou e foi iluminada pelos faróis da Chevrolet Veraneio, então o carro de reportagem da Globo. “Foi um susto, todos ficamos apavorados. Tínhamos ali os faróis, o problema era que eles não iluminavam o meu rosto. Eu disse, calma, eu me ajoelho! E tudo saiu à perfeição”, Glória conta. Saber sair de situações difíceis é uma característica que ela sempre teve. Novamente pioneira, anos mais tarde, em 2007, fez a primeira transmissão em Alta Definição da TV Brasileira, na Cidade Proibida, em Pequim, para o Fantástico.